A distância do céu à Terra, quando se fala em amor ao semelhante, não pode ser medida em anos-luz. Mas, é a própria distância que alguém coloca em relação ao seu próximo. O conceito de "próximo" é o mesmo de ser humano, aquele que habita as bordas planetárias ou o centro da nossa casa. A distância do homem ao seu cofre tem sido muito menor que o espaço que o separa de seus irmãos, obrigando-o a ser sentinela dos seus bens e descuidado para com as suas amizades e virtudes.
Que o diga sua majestade, Hajji Hassanal Bolkiah Muhizzaddin Waddaulah, sultão de um pequenino país chamado Brunei. Considerado o homem mais rico do planeta, possui um patrimônio de 40 milhes de dólares, 165 Rolls-Royces, 650 cavalos puros-sangues, 23 palácios, 1,4 bilhão em obras de arte e às vezes dá gorjetas de 170 mil dólares. Para ninar um seu sobrinho, mandou fazer uma réplica do quartel das tartarugas ninjas, lançando pelos ares a bagatela de 975 mil dólares. Ao comprar mísseis Exocet, quis disparar um deles somente para observar a fornalha que ele produzia, e o fez, queimando com isso 200 mil dólares. Seu carro predileto dentre as centenas que coleciona, leva uma placa de ouro no capô, citando que a construção do mesmo foi especial para sua majestade. Para homenagear a memória do seu pai, mandou construir uma mesquita e a decorou com azulejos venezianos, e por fora, com placas de ouro com 22 quilates. Mansões na Inglaterra, em Paris, aviões, iates, ouro, muito ouro...
Por que um único homem possui tanto e tantos nada possuem? E mais. Por que um homem é capaz de gastar milhões de dólares em atos improdutivos e deixa morrer a míngua irmãos seus que moram alhures? Se um gole de água mata a sede, por que o homem quer o rio somente para si? Sua majestade só consegue montar um cavalo de cada vez. Habitar um único quarto por dia. Dirigir um único carro... Então, porque 650 cavalos, 1788 cômodos no palácio real, dezenas de Rolls Royces, Mercedes Ferraris...?
Na verdade sua majestade é um homem comum, que só possui de seu aquilo que pode levar deste mundo. E o que é então que ele possui, pergunta Pascal em "O Evangelho Segundo o Espiritismo". Nada do que se destina ao uso do corpo, e tudo o que se refere ao uso da alma: a inteligência, os conhecimentos, as qualidades morais.
Seria legítima a fortuna de sua majestade? "Uma propriedade só legitimamente adquirida quando para conquistá-la não se prejudicou a ninguém".
O sultão, governando como dono e senhor, país tão pequeno, apropriando-se de toda renda de seu petróleo, estará promovendo o bem-estar físico, social e mental de seus súditos?
Qual seria então o melhor emprego de sua fortuna? Amai-vos uns aos outros, esse é o melhor roteiro para filmes assim. Aquele que ama Deus recebe Dele as diretrizes para empregar com sabedoria a sua fortuna, fazendo frutificar cada centavo que aplica, pois o faz a beneficio do progresso geral. Aplicações exageradas em si próprio costumam produzir pesados débitos no banco da vida. A fortuna deve correr como a água que a tudo irriga em sua passagem. Ao mesmo tempo, deve ser empregada com lucidez e previdência, pois Deus não ordena atirar fora o que se possui, tornando-se em seguida um peso para a sociedade.
Mas, saiamos um pouco da luz evangélica e adentremos a sabedoria de "O Livro dos Espíritos", em suas perguntas 814 e 815.
- Por que Deus deu a uns a riqueza e o poder, e a outros a miséria?
- Para provar, cada um, de maneira diferente. Aliás, sabeis que os próprios Espíritos escolhem essa prova e, freqüentemente, nela sucumbem.
- Qual das duas provas é a mais terrível para o homem, a da infelicidade ou a da fortuna?
- Tanto uma como a outra o são. A miséria provoca o murmúrio contra a Providência e a riqueza leva a todos os excessos.
Como se vê, sua majestade traz sobre os ombros uma imensa responsabilidade frente a fortuna que detém. Olhos acostumados ao brilho, parece nunca ter visto a fome na África, a miséria no Brasil, a tragédia do mundo. Trinta milhões de dólares gastos nababescamente em uma única festa, quantas escolas ou hospitais construiriam? Quanto alimento cobriria a mesa vazia ou quantas famílias abrigaria, um tiro no nada que queimou duzentos mil dólares?
O câncer, a hanseníase, a paralisia, esperam por mãos de amparo que parecem nunca chegar. A mensagem de Jesus segundo "não se pode servir a Deus e a mamon" nunca foi tão especial. O exemplo de Francisco de Assis diante de tanta tragédia bordada a ouro, brilha mais que o próprio ouro. O Espiritismo, com seu lema "Fora da caridade não há salvação" é o luminoso farol nessa selva de brilhantes.
O homem vale pelo que traz no seu coração. A cobiça o torna surdo e cego e a bondade o liberta da aflição. O Evangelho de Jesus é um código para livrar o Espírito da dor e fazê-lo chegar mais depressa ao seu destino. Mas o homem, insensato que é, escolhe na maioria das vezes o terreno mais áspero, o roteiro mais difícil, o tempo mais longo. Em seus desejos egoístas, recusa o ouro do sol, a luz das estrelas, a liberdade do pós-morte, preferindo pedaços de metal e pedrarias, que sequer pode alimentá-lo.
Quando sua majestade desencarnar, irá em um único caixão. Será levado por um único carro para uma única cova. Aos milhões serão apenas as bactérias que se alegrarão com seus depojos.
E o que acontecerá depois? Bem, para sabermos, voltemos ao Evangelho: "Ao viajante que chega a uma estalagem, se ele pode pagar é dado um bom alojamento; ao que pode menos, é dado um pior; e ao que nada tem, é deixado ao relento. Assim acontece com o homem, quando chega ao mundo dos Espíritos: sua posição depende de suas posses, com a diferença de que não pode pagar em ouro".
Esse penoso instante o faz lamentar ter tido tanto, quando rico, e não ter sabido converter suas moedas ao câmbio divino. Esse momento amargo, essa inversão brusca de bilionário para mendigo, tira-lhe o chão dos pés e nada mais resta fazer senão adaptar-se às condições miseráveis as quais se condenou. Se na Terra o ouro fascina, no céu ele faz cina, a depender de como é usado.
A única passagem evangélica em que Jesus foi visto com uma moeda na mão, refere-se a ocasião em que Ele indagava à multidão de quem era a efígie nela esculpida. Lembrando o desapego dos bens terrenos que caracterizou Jesus, não estou endossando a pobreza, a miséria nem a mendicância. Mas, apelando ao bom-senso para que cada um viva com o necessário evitando que o seu supérfluo fomente a miséria de outros.
Vivamos modestamente para morrermos honradamente. O ouro para reluzir precisa da luz que o toque. Busquemos antes a luz, pois sem ela nenhum brilho iluminará nossas vidas, nem antes nem depois da morte.
(Do Livro "Espiritismo e Justiça Social" - Luiz Gonzaga Pinheiro).
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